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Disputa na equipe: os duelos de pilotos na Ferrari, Haas e Toro Rosso

Disputa na equipe: os duelos de pilotos na Ferrari, Haas e Toro Rosso

Todo piloto sabe disso: “O primeiro adversário é o companheiro de equipe”. A disputa interna, portanto, é sempre uma atração na F1. Claro, isso nos times que as permitem.

E na temporada programada para começar dia 17 de março na Austrália, bota atração nisso. Na realidade, este ano há tantos duelos capazes de chamar a atenção, com desdobramentos diretos no futuro de seus participantes, que essa competição particular se iniciará já nos testes de inverno.

Serão duas sessões no Circuito da Catalunha, em Barcelona, de 18 a 21 de fevereiro, e de 26 a 1º de março.

Como há na F1 dez escuderias, teremos dez lutas. Hoje vamos mostrar o cenário da disputa entre companheiros em três delas, Ferrari, Haas e Toro Rosso. Amanhã abordaremos Mercedes, Renault e McLaren. No terceiro dia será a vez de Red Bull, Racing Point (ex-Force India), Alfa Romeo (ex-Sauber) e Williams.

Ferrari

Sebastian Vettel x Charles Leclerc é provavelmente, nesse sentido, a competição mais aguardada do ano. Há muita coisa em jogo no confronto. Vale a pena nos estendermos nele.

Vettel, alemão, 31 anos, vai para sua 12ª temporada inteira. Estreou no GP dos Estados Unidos de 2007, pela BMW Sauber. Começa sob grande desconfiança da torcida italiana e até mesmo da nova direção da Ferrari, agora comandada por Mattia Binotto, sendo o francês Laurent Mekies responsável pela área esportiva. Maurizio Arrivabene foi dispensado.

Em 2018, sem os vários erros de Vettel, a Ferrari teria chances de ser campeã, apesar de a questão ser mais complexa, como veremos. O modelo SF71H se mostrou, na média, mais eficiente que o W09 da Mercedes de Lewis Hamilton, vencedor do campeonato.

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Foi exatamente por não acreditar, ou pelo menos duvidar, que Vettel é o líder que a Ferrari necessita para voltar a conquistar o título que o seu falecido presidente, Sérgio Marchionne, fez questão de colocar ao seu lado um piloto jovem de grande potencial, o monegasco Charles Leclerc, de 21 anos.

Foi preciso quebrar uma tradição da Ferrari. Os italianos não contratavam piloto com pouca experiência. Leclerc faz parte do grupo das exceções, como Gilles Villeneuve, em 1977, com um único GP de F1, pela McLaren. O monegasco disputou 21 GPs em 2018 no seu ano de estreia na F1, pela Sauber. E na metade do campeonato já ia tão bem que Marchionne decidiu dizer a Vettel, através de atos, que seu tempo de conforto na Ferrari acabaria.

Sebastian Vettel

Kimi Raikkonen correu em função de Vettel na maior parte do seus quatro anos juntos no time italiano, de 2015 a 2018. São amigos fora dos autódromos, residem próximos, na Suíça. Marchionne morreu, mas Binotto precisa saber o que Leclerc é capaz de fazer. Se de verdade é o piloto com mais chances de levar a Ferrari a ser campeã novamente, demonstrado o tempo todo como membro da Ferrari Driver Academy (FDA) desde o começo de 2016.

Na luta pela melhor colocação no grid, em 2018, Vettel foi bem melhor que Raikkonen, o placar terminou 17 a 4. No campeonato, Vettel foi vice-campeão, com 320 pontos, com cinco vitórias e cinco poles. Hamilton, campeão, somou 408. Raikkonen acabou em terceiro, com 251, uma vitória, uma pole.

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O monegasco, pelo seu histórico de sucesso e personalidade forte, ambiciosa, não aceitaria assinar com a Ferrari conhecendo, de antemão, sua condição de subalterno aos interesses de Vettel, como fez Raikkonen. Com isso a Ferrari quebrará mais um tabu este ano: até que um de seus pilotos se mostre bem mais eficiente que o outro, não concentrará sua atenção em nenhum deles.

Nem todos acreditam nisso. Mas a Ferrari não tem alternativa. Impor ordens de equipe a Leclerc seria voltar a jogar todas suas fichas em Vettel, como fez em 2017 e 2018, com carros potencialmente campeões, e os títulos não vieram. O alemão não pode ser considerado o único culpado, mas sua responsabilidade no fracasso é inegável.

Charles Leclerc

Um dos pontos débeis da Ferrari era o seu diretor geral, Arrivabene. O ex-diretor técnico supercampeão com a escuderia, Ross Brawn, de 1997 a 2006, afirmou que os erros de Vettel não poderiam ser vistos isoladamente. Era uma crítica a Arrivabene, que não protegeu Vettel das imensas pressões de competir pela Ferrari.

O bom da luta entre Vettel e Leclerc é que ambos estão, nesse momento, livres para mostrar o que podem fazer com o carro da Ferrari.

Cada um vai procurar marcar seu território o quanto antes possível. Foi mencionado que a luta entre companheiros começará nos testes de Barcelona. No caso da Ferrari, não erraríamos se víssemos os dois dias de treinos realizados em Abu Dhabi, logo depois do fim do campeonato, em novembro, como um avant-première do confronto.

Os dois aceleraram o modelo SF71H de 2018. Vettel no primeiro dia, 27, e Leclerc, no seguinte. Não se trata de nenhum raciocínio conclusivo, mas apenas de uma sugestão para entendermos que Leclerc vai procurar explorar o ponto fraco de Vettel desde o primeiro momento: o controle emocional. Sob forte pressão o alemão tem histórico de tomar decisões equivocadas na pista, comprometendo a conquista de melhores resultados.

No Circuito Yas Marina, Vettel registrou no primeiro dia 1min36s812, enquanto Leclerc no segundo, 1min36s450, ou 362 milésimos mais veloz. Os pneus eram do mesmo tipo, segundo a Pirelli informou na época, mas não sabemos qual o seu nível de desgaste, algo com profunda interferência no resultado. Em relação ao nível de gasolina no tanque, provavelmente era semelhante. A Ferrari, bem como os demais times, treinam com um certo padrão de massa de combustível no carro.

De novo, os 362 milésimos de Leclerc não servem de referência para comparar o trabalho de um e outro piloto, mas denota como o monegasco vai dar tudo de si e mais um pouco para mostrar rapidamente ao adversário o que pode fazer, tudo com o objetivo de desestabilizá-lo e, obviamente, capitalizar com isso.

Não é dito que não pode acontecer ao contrário. Vettel usar sua experiência de quatro vezes campeão do mundo, 52 vitórias, 111 pódios, 55 poles, 220 GPs, e contrariar seu histórico de reações surpreendentes quando sob pressão. Nessa hipótese, o desafio maior seria transferido para Leclerc.

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Mas, nesse sentido, o monegasco tem a seu favor exatamente retrospecto oposto ao de Vettel. Um fato marcante, por exemplo, além dos seus títulos na GP3, em 2016, e na F2, em 2017, é o que aconteceu no GP do Azerbaijão de F2, em 2017, disputado dias 24 e 25 de junho. Seu pai, Hervé, de 54 anos, morreu apenas quatro dias antes do evento. Leclerc viajou, estabeleceu a pole, venceu a corrida do sábado e na segunda prova, no domingo, apesar de largar em oitavo, como manda a regra do grid invertido, recebeu a bandeirada em segundo. Leclerc era profundamente ligado ao pai, ex-piloto também.

Em 2018, no seu primeiro ano na F1, Leclerc marcou 39 pontos, chegou dez vezes entre os dez primeiros. O seu companheiro, o sueco Marcus Ericsson, na sua quinta temporada na F1, somente 9 pontos.

Dá para entender a posição dos líderes da Ferrari? Não seria inteligente conter o ímpeto de Leclerc, limitar sua grande capacidade de conquistar resultados, expor seu enorme talento. É provável que Binotto só interfira se ele e Vettel começarem a se chocar na pista, como aconteceu entre Lewis Hamilton e Nico Rosberg na Mercedes, exigindo regras internas, controladas por Toto Wolff.

Vettel inicia seu trabalho ao lado de Leclerc fazendo muita gente se lembrar do seu campeonato de 2014, na RBR. O alemão vinha de quatro títulos seguidos, tendo como companheiro um piloto de menos recursos que o seus, o australiano Mark Webber. Mas quando Daniel Ricciardo o substituiu e o carro da RBR, com o novo regulamento, se tornou menos competitivo, Vettel perdeu e por muito o duelo com Ricciardo.

O australiano somou 238 pontos, terceiro no mundial de 2014, venceu três vezes, enquanto Vettel, 167, quinto, sem vitórias.

Mais uma vez, isso não quer dizer que agora Vettel já começa atrás a disputa com Leclerc. Nada impede de o novo carro da Ferrari, concebido para outro regulamento, apresentar reações que favoreçam mais o alemão. E ele próprio iniciar uma nova fase na carreira. Tornar-se mais sereno, menos propenso a cometer erros em situações de elevada pressão.

Mas é inegável que o campeonato de 2019 será um teste de fogo para Vettel. Seu contrato, assinado em agosto de 2017, se estende até o fim de 2020. O de Leclerc é plurianual, sempre com opção da Ferrari. Se Vettel repetir 2014, será difícil para ele manter-se na Ferrari em 2020, apesar do contrato.

Os italianos não o impediriam de sair, ninguém deseja um profissional insatisfeito no grupo, seja lá qual for o motivo. Sua imagem, no entanto, estaria completamente arranhada. É prudente, no entanto, não colocar a carroça na frente dos bois.

A Ferrari apresenta o seu modelo de 2019 dia 15 de fevereiro, na sede da organização, em Maranello.

Haas

A equipe norte-americana terá pela terceira vez a mesma dupla de pilotos, o francês Romain Grosjean, 32 anos, com 145 GPs de experiência, e o dinamarquês Kevin Magnussen, 26 anos, 82 GPs. No ano passado, Magnussen somou 56 pontos, nono colocado. Grosjean esteve perto de perder o lugar na Haas ao não somar pontos nas oito primeiras etapas, enquanto Magnussen já tinha 27. Em quatro provas, dessas oito, terminou entre os dez primeiros.

Grosjean reagiu a partir do GP da Áustria, nono do calendário, com ótimo quarto lugar. Nas 12 etapas seguintes, em seis marcou pontos.

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Tanto Grosjean quanto Magnussen são dois dos mais aguerridos pilotos do grid. Há colegas que reclamam da dificuldade de ultrapassar o dinamarquês, por ser “perigoso” na defesa de posição. E Grosjean tem por vezes impulsos inesperados. Teve responsabilidade em boa parte das ocasiões em que não marcou pontos nas oito primeiras corridas.

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Não há animosidade na relação entre Grosjean e Magnussen, dentro e fora da pista, apesar da competitividade de ambos. Mas se a Haas seguir evoluindo e o carro deste ano permitir que encostem ainda mais nos primeiros colocados, os dois vão disputar o mesmo espaço. A luta se intensificará e pode até emergir daí uma disputa acirrada entre ambos.

Grosjean é reconhecidamente mais veloz em uma volta lançada, apesar da vitória apertada na competição por largar mais na frente no grid, 11 a 10. Mas o dinamarquês é mais constante em corrida, erra menos, tem maior lucidez ao tomar as decisões naqueles milissegundos na pista.

A Haas apresentou a pintura que usará este ano na quinta-feira, dia 7, mas o modelo de 2019 será lançado somente no primeiro dia de treinos, dia 18, no Circuito da Catalunha, pouco antes de eles começarem. A Haas compete com unidade motriz, transmissão e suspensões traseiras da Ferrari. São os mesmos componentes que estarão nos carros de Vettel e Leclerc. Abraços.

Toro Rosso

Helmut Marko, responsável pelo programa de jovens da Red Bull, cobra de seus pilotos o compartilhamento de todas as informações técnicas, mas ao mesmo tempo estimula a competição entre ambos, desde que não se aniquilem, como aconteceu na Red Bull, no ano passado, entre Max Verstappen e Daniel Ricciardo, no GP do Azerbaijão.

A mesma filosofia vai orientar a relação entre o russo Daniil Kvyat, 24 anos, e o tailandês, nascido na Inglaterra, Alexander Albon, 22, na Toro Rosso este ano. São os novos pilotos do segundo time da Red Bull, com sede em Faenza, na Itália.

Como tanto a Toro Rosso como a irmã mais rica, Red Bull, serão equipes oficiais da Honda, este ano, haverá importante repasse de tecnologia do time de Max Verstappen e Pierre Gasly para a Toro Rosso de Kvyat e Albon. Em 2018, a Red Bull competia ainda com unidade motriz Renault, enquanto a Toro Rosso, Honda. Todo o conjunto traseiro do modelo da Toro Rosso será, agora, o mesmo da Red Bull, como faz a Haas com a Ferrari. O regulamento autoriza.

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Isso quer dizer que, provavelmente, Kvyat e Albon deverão dispor de um equipamento mais competitivo que o de 2018 da Toro Rosso, quando os japoneses usaram a temporada para desenvolver sua unidade motriz. A Toro Rosso-Honda terminou em nono, com 33 pontos, enquanto a Red Bull-Renault, em terceiro, com 419.

Kvyat tem mais uma chance de mostrar que pode ser um bom piloto de F1. Foi dispensado da Toro Rosso por Marko depois do GP dos Estados Unidos, em 2017, sendo que ano anterior, Marko e o diretor da Red Bull, Christian Horner, decidiram trocar Kvyat e Max de posição a partir do GP da Espanha, quinto do campeonato. Max estava na Toro Rosso e o russo na Red Bull.

E o que aconteceu na estreia de Max na Red Bull, em 2016, em Barcelona? Venceu a corrida! Kvyat ainda seguiu na Toro Rosso em 2017, até o substituírem pelo francês Pierre Gasly. O diretor do time, o austríaco Franz Tost, afirmou que Kvyat na realidade nunca se recuperou, emocionalmente, do rebaixamento da Red Bull para a Toro Rosso, em 2016.

Na temporada passada, a Ferrari o contratou para ser o seu piloto de desenvolvimento no simulador. A nova chance na Toro Rosso apareceu por uma razão simples: Marko não tem nenhum piloto no seu programa em condições de ascender à F1.

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Take a closer look at our 2019 challenger 👀 ⁣ ⁣ #F1 #ToroRosso #STR14 #Honda #RedBull #Motorsport #📷 x @digital.lighthouse

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Mais maduro, com um ano no grupo da Ferrari, espera-se que a experiência de Kvyat, apesar dos 24 anos, seja útil a Toro Rosso. Isso permitiu a Marko e Tost colocarem do seu lado um estreante, Albon. O tailandês disputou o título da F2, em 2018, pela DAMS, até a última etapa, em Abu Dhabi, em novembro. Acabou em terceiro, atrás do campeão, o inglês George Russell, 20 anos, da ART, e contratado pela Williams, e de outro inglês, Lando Norris, 19, da Carlin na F2 e titular da McLaren, este ano.

Albon não tem um currículo espetacular como por exemplo Russell, campeão da GP3, em 2017, e da F2, no ano passado, em sua primeira temporada nas duas competições. Por isso, ao menos no início a preocupação maior será de entender o novo e complexo desafio da F1. Albon não tem títulos na carreira, na F Renault 2.0, GP3 ou F2, o que não quer dizer não possa vir a ser um piloto eficiente na F1. Kvyat tem melhor retrospecto e não decolou como Marko pensava, pois fora campeão da F Renault 2.0 Alps e campeão da GP3.

Albon fez parte do programa da Red Bull, em 2012, mas Marko o dispensou. Agora está de volta, com a ajuda de seus patrocinadores.

Ao menos no começo Kvyat e Albon devem ter mais em mente fazer o carro da Toro Rosso-Honda evoluir do que concentrar todas as energias em ser mais eficiente que o outro, mas essa competição sempre os orientará também. A Toro Rosso perdeu seu diretor técnico, James Key, para a McLaren, e não repôs a vaga. O seu grupo de engenheiros decidirá as questões mais importantes de forma colegiada.

Kvyat versus Albon será a luta de um piloto com 74 GPs de experiência, um ano e meio em uma escuderia vencedora, Red Bull, dois pódios, contra um colega estreante sem um currículo impressionante.

A Toro Rosso apresentará seu modelo de 2019 na segunda-feira, dia 11.

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