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Sérgio Sette Câmara fala sobre a busca pela licença para a F1

Sérgio Sette Câmara fala sobre a busca pela licença para a F1

Sérgio Sette Câmara, em depoimento ao jornalista Livio Oricchio.

Olá amigos!

Para quem teve alguns dias livres de compromissos profissionais, como eu, deu para dar uma descansada? Minha agenda nessa pausa do calendário da F2 foi intensa. Estive em São Paulo, participei de um programa na TV Globo, fui à sede da Youse, minha patrocinadora, revi amigos e gravei vídeos. Depois treinei de kart na Granja Viana, uma paixão e uma necessidade, para manter elevado o nível dos reflexos e, claro, segui um rigoroso programa de preparação física na minha cidade, Belo Horizonte, e onde resido desde que me transferi para a Europa, perto de Barcelona, a fim de seguir carreira de piloto, chegar na F1 e ser campeão do mundo.

Quando você ler este meu depoimento, vou estar a caminho ou mesmo já estarei no sul da Bélgica, nas pequenas e lindas cidadezinhas ao redor do circuito que todo piloto, ao menos a maioria, adora, Spa-Francorchamps. Ainda bem, estou com saudades de acelerar meu carro. Que cidadezinhas são essas, essa é sua pergunta? Vamos lá: Spa, é uma delas, Francorchamps, outra, Malmedy, Robertville e Stavelot. É uma pista à moda antiga. Longa, 7.004 metros, larga, com curvas para todos os gostos. Quer um exemplo?

Logo que cruzamos a linha de chegada há uma freada das mais fortes, para contornar a curva 1, a La Source, bem lenta, à direita, em primeira marcha. Mas as duas seguintes estão dentre as mais velozes do calendário, as conhecidas Eau Rouge, à esquerda, e imediatamente à direita, a Raidillon. Um “S” de altíssima velocidade. Mas o que mais impressiona quem chega pela primeira vez no autódromo é sua topografia.

Lembro da minha estreia lá com a F3. Achei uma loucura. A TV não mostra o grande declive da reta que antecede a Eau Rouge e menos ainda o aclive que se estende logo em seguida, na Raidillon. É uma verdadeira parede, tal o desnível da parte mais alta da Raidillon e a mais baixa da Eau Rouge.

Por causa da elevada geração de pressão aerodinâmica nos nossos carros e a aderência dos pneus Pirelli, mais largos este ano, nós passamos por essas curvas com o pé embaixo, flat out, mas você tem de estar muito atento às reações do carro. Tem de ser preciso. Perder o seu controle por ter entrado em um ângulo errado ou tocado as zebras com certa violência, por exemplo, pode ser perigoso. Estamos naquele ponto a uns 260 km/h. Mas em condições normais transpomos a Eau Rouge e a Raidillon sem grandes dificuldades.

A sensação? Há coisas na vida que por mais explícito e rico na descrição não conseguiria passar o que sentimos ao escalar uma montanha abrupta, sentado em um carro com o bumbum quase no nível do asfalto, a quase 300 km/h. É tudo único, não há referências para dar uma ideia da sensação. O que posso dizer é que ao longo do campeonato não existe nada semelhante. Se eu recomendo a vocês? Muitíssimo.

A F1 tem um programa chamado F1 Experience. Você pode pagar determinado valor, ouvi dizer que é caro, e sentir um pouco do que é em um carro de F1 de dois lugares. Escolha Spa para essa experiência única. E depois serei eu quem irá ler o seu depoimento. Combinado?

Eu falava das curvas diferentes de Spa. Outra delas que me impressiona pela velocidade e, obviamente, grande prazer, é a Pouhon. São duas curvas na realidade, no fim de outra descida acentuada. Temos a Pouhon 1 contornada aí a algo como 220 km/h e a Pouhon 2, de pé embaixo, a uns 250 km/h.

Este ano os carros da F2 mudaram, geram mais pressão que os de 2017, daí eu não estar sendo tão preciso. Todos nós vamos descobrir como os novos carros da F2 se comportam nessa pista rápida e desafiadora. Houve uma grande mudança no regulamento da F2 de 2017 para cá.

Gostaria de chamar a atenção também para a curva Blanchimont, à esquerda, longa, aberta, da mesma forma percorrida com o acelerador no curso máximo, a uma velocidade de quase 300 km/h. Entendeu melhor por que gostamos tanto de competir em Spa?

Sonho realista

Estou indo para lá com uma meta bem definida. Conforme tenho escrito nessas nossas conversas, como acho difícil lutar pelo título nas quatro etapas que restam do campeonato, oito corridas, por causa dos muitos problemas que tive ao longo do ano até agora, o meu objetivo é terminar a temporada entre os três primeiros colocados, a fim de obter a superlicença, documento que me autorizaria competir na F1, sonho de todos nós, os 20 pilotos no grid da F2, se surgir uma oportunidade. Acredito nela. Se não for no fim deste ano, o mais provável, será então ao término do campeonato de 2019.

Nesse instante, depois de oito etapas, 16 corridas, somo 106 pontos, ocupo o sétimo lugar na classificação. O líder é o inglês George Russell, da equipe ART, e integrante da Academia da Mercedes, com 171. Não miro muito nele e nem mesmo no meu companheiro na equipe Carlin, outro inglês, Lando Norris, segundo, com 159 pontos, piloto da McLaren, mas no terceiro colocado, o tailandês Alexander Albon, da DAMS, com 141 pontos. Ele está 35 pontos na minha frente.

Repito o que tenho escrito a vocês desde nossos primeiros encontros: a Carlin me disponibiliza um carro para lutar pelo pódio quase sempre. Daí minha confiança em, não enfrentando os problemas deste ano, avançar bastante na classificação do campeonato não apenas em Spa, mas depois em Monza, uma semana mais tarde, dias 1º e 2 de setembro, na Rússia, dias 29 e 30, e na etapa final, em Abu Dhabi, somente dois meses mais tarde, dias 24 e 25 de novembro.

Nesse período de supostas férias de agosto, estive em contato regular com o pessoal da Carlin, o meu ótimo engenheiro, o Daniele Rossi, que já trabalhou com Sebastian Vettel na antiga World Series, categoria parecida com a F2, hoje extinta. Sexta-feira temos em Spa uma sessão livre e a de classificação para o grid da corrida do sábado.

Venci lá em 2017

Tenho boas memórias do Circuito Spa-Francorchamps. No ano passado, o de minha estreia na F2, com a equipe holandesa MP Motorsport, não dispus de um grande carro na maior parte do campeonato. Mas na Bélgica estávamos rápidos. Choveu na definição do grid e em Spa, com o piso molhado, você tem de acreditar de verdade no carro para ter confiança e tirar velocidade. Não era o nosso caso em 2017.

Fiquei em 11º na classificação e meu companheiro, bem mais experiente na categoria, Jordan King, foi apenas 16º. Na corrida do sábado, no seco, o carro estava bem melhor, a ponto de eu avançar na classificação até o sexto lugar. Com o critério do grid invertido entre os oito primeiros na F2, como fui sexto no sábado larguei em terceiro na corrida do domingo.

Estavam na minha frente o francês Norman Nato, da Arden, primeiro no grid por ter sido oitavo no sábado, e o espanhol Roberto Merhi, da Rapax, segundo. Eu sabia que meu carro estava bem acertado para aquela pista seca, com aderência bem melhor que na sexta-feira. Resultado: assim que as luzes apagaram, no domingo, consegui tracionar muito bem e ultrapassei o Nato e o Merhi para contornar a curva 1 em primeiro. E me mantive na liderança até a bandeirada, no fim da 18ª volta, com 39 minutos de corrida. É mais curta que a do sábado.

“Automobilismo depende muito de você, verdade, mas também o peso da eficiência do carro e da equipe contam muito.”

Foi minha primeira vitória na F2 e até agora única. Estou perto da segunda. Este ano, na última etapa, na Hungria, dias 28 e 29, obtive a minha primeira pole position.

Junte o meu moral alto com a pole há menos de um mês em Budapeste com o ânimo da vitória em 2017 em Spa e você tem uma melhor imagem do meu estado de espírito para o GP da Bélgica de F2 de 2018. Sempre, obviamente, com os pés na terra. Automobilismo depende muito de você, verdade, mas também o peso da eficiência do carro e da equipe contam muito.

Torça por mim no fim de semana. Tenha certeza de que essa vibração chega até onde estou e ajuda a me harmonizar para o desafio proposto por essa pista tão espetacular quando exigente. Tenho certeza de que estaremos juntos mais uma vez. Grande abraço!

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